quarta-feira, 31 de agosto de 2016

Para que serve a lucidez?

Para que serve a lucidez?

Para assistirmos, imersos em desespero e impotência, aos processos obscuros da história que nos rodeia?
Que diferença faz a consciência crítica, se ela apenas observa, atônita, inerte?
Pra que serve a lucidez, se nossa palavra e sensatez não faz eco nos desvios que os caminhos deveriam fazer?
De que vale a cosmovisão, se ela não volta para o chão para intervir no curso macabro de certos devires?
A que serve tantas pessoas cientes, tantas análises, tantas explicações?
A que serve tantos entendedores de Foucault? Tantos cientistas políticos? Tantas hashtags? Tantos do “lado certo da história”?

Ao que parece, esquecemos que é preciso estar presente para além da voz ou para além do olhar. De que adiantou assistirmos esse quadro tenebroso surgir no horizonte, horrorizados? Que diferença faria assistir a ele, alienados? Que nos falta pra usar nossas forças? Precisamos pular os muros ilusórios criados por eles, esses muros não existem! Perfuremos a casca dura forjada historicamente para isolar-nos daquilo que são nossas próprias rédeas!

Não é mau desejar o bem coletivo, não é mau sair de nossos solitários quadrados claustrofóbicos e vislumbrar o melhor para algo além do espaço vazio que já fora ocupado por nossos cordões umbilicais. 

É preciso perfurar a parede de concreto e crime que nos separa da “política” que aí vigora. Não há política sem a sociedade e uma parte da sociedade sempre será apenas uma parte dela. Nós somos mais. Temos que invadir com raiva e amor no coração as entranhas deste território que nos vem sendo negado. 

Não é a toa que muitos dizem “não estar nem aí” para política. Apenas seguem o script tal qual ele foi escrito. É como não estar nem aí pra sua casa. Uma hora ela vai cair na sua cabeça, e vai ser impossível se mover, tantos entulhos pelo chão não lhe permitirão saber onde ou como pisar, não haverá mais nada limpo, nada o que comer, as paredes ruirão. Não haverá movimento além do acúmulo de deterioração. A tendência é ou morrer, parado e inerte em meio a isso, ou tomar atitudes práticas, pensar no que tirar primeiro, que movimento fazer, onde pisar, para que lado se virar ou ao menos, para onde olhar… E nem que seja nesse momento, vai ter que se estar “aí pra política”, por que é a sua casa! É a sua vida! São nossas cidades! É o nosso planeta! É o seu caminho que está sendo conduzido por quem não se importa com a sua existência. Que sentido faz isso?

Precisamos ocupar esses espaços que são nossos mas que historicamente nos foram usurpados, nunca os ocupamos devidamente, desde a colonização. Precisamos reunir nossas mentes e energias mas também nossos braços e pernas, para construir o que queremos, a construção não se fará sozinha, chega de pensar: Ajamos! Tomemos nossas rédeas! Perfuremos as crostas que fecharam as instituições, as esferas públicas! Sejamos a “luz do sol, que a folha traga e traduz em verde novo, em folha, em graça, em vida, em força, em luz”, ou sejamos todos soterrados por essas ruínas que há tempos caem em nossas cabeças.

!!!!!

sexta-feira, 26 de agosto de 2016

porções de nada

Falo coisas em minha mente o tempo inteiro. Narro o que vejo, seja de meus olhos pra dentro, seja de meus olhos pra fora. Narro como se escrevesse um livro durante todas as 24 horas dos dias. Como alguém que à espreita é expectador de si mesmo e os acontecimentos que o envolvem. Como se uma dimensão do eu que sou, saísse de mim e me olhasse de fora mesmo que de dentro.

Coleciono buracos. Como um personagem de um filme que vi... Faço buracos nas coisas e me aposso deles, como se aquelas porções de nada fossem minhas e fizessem parte de mim.

Talvez o personagem fale de todo mundo, talvez todo ser humano seja um colecionador de buracos, mas cada um cria um jeito de fazê-los e inventa a disposição na qual eles serão arrumados ou mesmo o espaço e a dimensão que eles ocuparão na sua vida.

Parece possível então que alguém escolha -ou que a vida escolha por esse alguém- se cobrir de buracos. Posso até ver o passar lento do tempo presenciando a criação cuidadosa e invisível de cada porção de vazio. A cada nova manhã o nascimento de um nova marca negativa surgindo devagar no relevo áspero do algo no qual se forma o buraco. Cada lasca de coisa sendo retirada para abrir espaço para o próprio espaço...

Seria um ser/estar que não é e nem está, então? Se alguém se cobre de buracos, se torna um? Um monte de buracos cheios de nada? Um grande buraco, feito de pequenos outros? Um preenchimento vazio. Um vazio que preenche.... Nadas...



quarta-feira, 24 de agosto de 2016


eu vi a violência, e ela tinha olhos fundos...