Para que serve a lucidez?
Para
assistirmos, imersos em desespero e impotência, aos processos obscuros
da história que nos rodeia?
Que
diferença faz a consciência crítica, se ela apenas observa,
atônita, inerte?
Pra
que serve a lucidez, se nossa palavra e sensatez não faz eco nos
desvios que os caminhos deveriam fazer?
De
que vale a cosmovisão, se ela não volta para o chão para intervir
no curso macabro de certos devires?
A
que serve tantas pessoas cientes, tantas análises, tantas
explicações?
A
que serve tantos entendedores de Foucault? Tantos cientistas políticos? Tantas hashtags? Tantos do “lado certo da história”?
Ao
que parece, esquecemos que é preciso estar presente para além da
voz ou para além do olhar. De
que adiantou assistirmos esse quadro tenebroso surgir no horizonte,
horrorizados? Que diferença faria assistir a ele, alienados? Que nos
falta pra usar nossas forças? Precisamos pular os muros ilusórios
criados por eles, esses muros não existem! Perfuremos a casca dura
forjada historicamente para isolar-nos daquilo que são nossas
próprias rédeas!
Não
é mau desejar o bem coletivo, não é mau sair de nossos solitários
quadrados claustrofóbicos e vislumbrar o melhor para algo além do
espaço vazio que já fora ocupado por nossos cordões umbilicais.
É
preciso perfurar a parede de concreto e crime que nos separa da
“política” que aí vigora. Não há política sem a sociedade e
uma parte da sociedade sempre será apenas uma parte dela. Nós somos
mais. Temos que invadir com raiva e amor no coração as entranhas
deste território que nos vem sendo negado.
Não é a toa que muitos
dizem “não estar nem aí” para política. Apenas seguem o script
tal qual ele foi escrito. É como não estar nem aí pra sua casa.
Uma hora ela vai cair na sua cabeça, e vai ser impossível se mover,
tantos entulhos pelo chão não lhe permitirão saber onde ou como
pisar, não haverá mais nada limpo, nada o que comer, as paredes
ruirão. Não haverá movimento além do acúmulo de deterioração. A tendência é ou morrer,
parado e inerte em meio a isso, ou tomar atitudes práticas, pensar no que tirar
primeiro, que movimento fazer, onde pisar, para que lado se virar ou ao menos, para onde olhar…
E nem que seja nesse momento, vai ter que se estar “aí pra
política”, por que é a sua casa! É a sua vida! São nossas cidades! É o nosso planeta! É o seu caminho
que está sendo conduzido por quem não se importa com a sua
existência. Que sentido faz isso?
Precisamos ocupar esses espaços que são nossos mas que
historicamente nos foram usurpados, nunca os ocupamos devidamente,
desde a colonização. Precisamos reunir nossas mentes e energias mas
também nossos braços e pernas, para construir o que queremos, a
construção não se fará sozinha, chega de pensar: Ajamos! Tomemos nossas rédeas! Perfuremos as crostas que fecharam as instituições, as esferas públicas! Sejamos a “luz do sol, que a folha traga e traduz em verde novo, em folha, em graça, em vida, em força, em luz”, ou sejamos todos soterrados por essas ruínas que há tempos caem em nossas cabeças.
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