“O
que é aqui?” assim começou minha experiência com um espaço
chamado Espaço Experimental e com o espetáculo “Cara da mãe” do
Coletivo Cênico Tenda Vermelha. À
deriva pelo centro histórico de Recife, um lugar me chamou atenção.
Passei, voltei e indaguei. Pois bem, a resposta
foi: “Vai ter um espetáculo, daqui a 20 minutos.” “Ah, que
legal! De quê? Dança? Teatro?” “Não tenho certeza, mas acho
que os dois...” “Quanto custa?” “20 reais”… “Obrigada”. Fiquei.
Recebemos
vendas vermelhas, feitas com um tecido que mais parecia uma tela, não encobria a vista totalmente, deixava apenas sobre o olhar
um filtro translucido de cor vermelha… Interessante… Aguardamos o
horário na escada, começou a chover lá fora. No momento certo
subi as escadas, curiosa, presente.
Guiados
pelas artistas, sentamos… Ouvimos vozes fortes, olhares intensos e penetrantes, elas se reportavam à nós. Saias rodavam suave e
ferozmente em contraluz espalhando a fumaça ao redor. Era vermelha
também a luz, branda. Várias cenas umas mais compreensíveis que
outras, se desenrolaram em nossa frente e éramos pouco a pouco
convidados a mergulhar em lembranças de coisas que não pertenciam a
nossa memória mas que ao mesmo tempo era de lá mesmo que haviam
saído.
Gestos
fortes, corpos em movimento, chão, mãos, pernas, pés. Era como se
eu estivesse flutuando em meio ao bailar das andorinhas quando o sol
se põe. Me desloquei de qualquer tempo-espaço, estava lá, em suspensão e podia
sentir tudo aquilo como um grande carinho, um grande abraço, um
aconchego de mãe.
Ao
final, fomos chamados para mais perto. E de repente me vi em um
ventre. Calmo, macio, líquido, translúcido e vermelho. E elas que
nesse momento já pareciam imagens de seres etéreos dentro de um
universo onírico e nostálgico, saíram do limbo de
saudade em que pareciam estar e abraçaram, um a um dos que estavam
presentes. Ao som de cantigas suaves… Sob a leveza dos sorrisos e
olhares surpresos ao redor.
“Sou de nanã euá euá eaê...” Ecoava... As ondas sonoras me tocaram cada poro... Emoção. Lágrimas… Não me contive. Não fui abraçada e nem
notei, pois que houve um abraço maior que me acalentou. Não queria
ir embora…. Mas fui… Flutuando procurei pelo caminho de casa e
achei, sentindo em meu "útero abissal" ecoar aquela intensa e bela
dança infinita.
Maravilha
pra mim é encontrar vez ou outra, distraidamente, esses ninhos tão
deliciosos de se aconchegar, onde se torna inevitável o descansar.
Essas coisas de gente me fascinam, não sei direito pra que serve ser
humano, mas sei que já encontramos uns jeitos suaves e bonitos de
tocarmos uns aos outros. Me comove muito sentir quão profundo podem
ser alguns momentos e o quanto os dias podem nos guardar coisas que
carregam o peso da gravidade e da essência desse mistério todo que
é existir sendo gente.
* a frase do título faz parte do espetáculo