Meus pés ficaram muito rachados esses tempos, chegando em um estágio de quase sangrar... Após uma de minhas reclamações, Ceci me disse: "mamãe acho que seus pés estão partidos por que o seu coração está partido." É esse texto.
inigmível
sexta-feira, 8 de outubro de 2021
na poeira espessa do tempo
Meus ossos não conseguem mais se ajeitar confortavelmente em meu corpo.
Tudo dói, tudo inflama. Duzentos e poucos pedaços de estrutura biológica completamente desajeitados, fora do lugar.Olhei aleatoriamente pro céu essa semana e peguei sem querer alguns finais de tarde ou melhor, eles me pegaram. Nuvens amareladas. Azul quente. O rósea pairando translúcido no ar. Poente. Como poente sou eu.
O tempo se esfarela em poeiras espessas e páginas amareladas, com suas manchas de vida.
Me incomoda muito como a sujeira dos anos se impregna na pele das mãos. Nem uma escovinha de limpeza tira a adesão do pó aos sulcos e vincos de nossa derme (e alma) depois de algumas horas de contato com os velhos objetos (e memórias) guardados.
sábado, 15 de agosto de 2020
limo
Estava no quintal agora a pouco, lembrei do que pensei/senti lá que me impulsionou a escrever aqui. Pensei no quanto gosto do limo. Da sua existência escura e úmida. Rasteira e devagar. Viva e de natureza macia. Pensei também no quanto gosto de restos envelhecidos de construção de cimento. Olhei ao redor, vi às pilastras de concreto encostadas no muro, com suas estruturas de vergalhão de ferro à mostra. O ser humano gosta muito de construir. Constrói indiscriminadamente, sem pensar em nada, constrói de olhos fechados e com muito afinco, aquilo que mais à frente acaba sempre por abandonar. A gente constrói na mesma medida em que abandona. Talvez seja tudo uma pretensão demasiada isso de buscar materiais duradouros, de querer permanecer, de buscar se perpetuar por meio das coisas. Tudo está indo e nossos muros e pilastras seguirão sendo abraçados suavemente pelo musgo. Por que para cada ruína há um cobertor de vida mole e verde, escuro e pegajoso à espreita, à espera, à disposição para nos falar sobre coisas que surgem da nossa impermanência... Ingênuos, temos pena dos insetos que vivem apenas um dia sem saber que a mesma pena têm de nós o mundo e as coisas que nós mesmos criamos.
terça-feira, 25 de fevereiro de 2020
Terça de carnaval•°
Tentei ir sozinha ao cinema ontem, não deu tempo.
Tentei ver Nostalghia, meu computador travou.
Tentei ver A chegada, dormi.
Não fui, não lembrei, não cheguei... Era tarde...
Acordei cedo e me perdi no emaranhado de músicas tristes com vozes sussurradas e suas capas de álbuns com imagens desbotadas de pessoas com cabelos desgrenhados e olhos vagos/espantados. Em meio às músicas, expectativas completamente infundadas e sonhos de um futuro que não vem, provavelmente. Dentro, alguma coisa bonita e triste jorra - incessante
domingo, 9 de fevereiro de 2020
Esvair-se
~~ Eu não tô conseguindo ~~
Sinto que vou passar por essa vida completamente invisível ( a que? a quem? Não sei).
Não entendo o que as pessoas fazem de diferente pra que lhes aconteça um batizado, um casamento ou um picnic dominical / matinal.
Meus problemas de tão infinitezimais diante dos problemas do mundo, hão de me causar um big bang ou pelo menos o nascimento de uma estrela anã ou um buraco negro.
Tenho chorado, não tanto por fora, mas tanto por dentro, que nem sei.
Esvair-se.
Vai
Ir
Se.
O amor comeu meu nome sim e minha identidade também. O amor passou do meu lado, comeu a si mesmo, e do avesso de si, desdenhou minha existência. Se comeu a mim foi por indiferença.
Juventude não há
Amor não há
Eu não hei de estar, em nenhum lugar
<<<Daqui a alguns anos esses aplicativos não vão mais existir>>>
Onde vamos ?
Poeira
Nas nuvens
Poeira
Na terra
Derreter
Esvair
Na espera vaga
Por alguma gota de um nada
Absoluto
Um não existir
domingo, 15 de dezembro de 2019
dezembro
O Brasil escorre ensanguentado por algum ralo do universo
Chove nesse instante acima da Linha do Equador
Entro no uber, com fones nos ouvidos
Estico o rosto para o lado e projeto o olhar através do vidro
Imagino alguém acarinhando meu pescoço docemente
Sigo vendo a decadência passar em câmera lenta e preto e branco por mim
Já é quase noite nessa chuva de dezembro
A escuridão ainda não se fez total
"Preciso parar na padaria antes"
Parei...
Não tinha mais o doce que eu queria.
domingo, 13 de outubro de 2019
dança solita
Me prostro debruçada num muro que dá para o nada. Me debato por defender o direito à poesia…
O que em minha matéria faz com que me afete tanto pelas pessoas que passam por mim?
Que tipo de conexões são essas que crio?
Eu não sei passar e nem deixar que passem. Parece que é de ficar que sou feita. E de ficar por aí, por onde será que tenho andado? Por que há tempos já nem me vejo e nem me acho.
Dessa vez estive diante da solidão e me vi muito mais distante de mim do que sequer pude imaginar até aqui.
De solidão nunca soube verdadeiramente…. Até que ela, triste, pesada e nua, amanheceu na beira da cama, travestida de saudade: Me encarou fixamente e eu morri. Morri por enxergá-la, de verdade, pela primeira vez na vida.
Talvez só seja solidão de fato, quando até mesmo a pessoa se vai de si.
Os tambores de Mateus Aleluia e a fé de Luedji Luna têm me soprado desejos de vida no decorrer dos dias.
Agora entendo o por quê de toda essa correria...
Dedos gelados tocando o meio da costa do universo deitado na cama. Suspiros de futuro... Arrepio doce... Dedos gelados tocando o meio da testa do universo em expansão. Suspiros de(s)ilusão. Olhando compenetradamente para um autômato delicado que fiz, penso, repentinamente, como quem desperta de profundo torpor, que é preciso deixar o futuro pra lá.
Já me despi de algumas coisas antes muito sólidas, como a ideia de amor, a ideia de maternidade, a ideia de relação, a ideia de felicidade... Nesse setembro de dois mil e dezenove, me despedi da ideia de futuro!
Futuro não há! O futuro não é! Como pude passar tanto tempo apoiada nessa não coisa?
Não entendo como a gente se preenche de tanta coisa que não existe... Que difícil "dar o prazer dessa contradança" quando não parece tocar música alguma, quando o par é ninguém e quando chão não há.
Mas é solitária, é solitária sim essa dança. A dança é solitária, mas por quê, então, tantos pares ao redor a bailar? O que ouvem? Será que cantam, baixinho, um para o outro? Será que fingem, ambos, ouvir alguma coisa, quando não ouvem mais do que os sons de seus sistemas nervoso e vascular trabalhando e talvez o barulho de suas próprias almas? Como de praxe, não sei.
Não ouço nada no momento e é bem escuro ao redor. Me mantenho aqui, quase parada por dentro e por fora, flutuando, com movimentos lerdos e olhar vago, entre idiomas e seres que não existem. Nas dobras do blusão, escondo, não um beijo, mas as coordenadas de uma coreografia secreta (até para mim mesma), descompassada, pensa, que espero que me sirva de algo, um dia.
quinta-feira, 5 de setembro de 2019
Aos poucos
<<Silêncio >>
Aquele silêncio que só os lugares desertos sabem fazer.
~Música de vento~
Por toda a rua apenas o movimento das folhas das árvores e, ao longe, o dos carros e pessoas nas duas ruas entre as quais a minha está.
<<Ninguém>>
Como um esparadrapo que se tira lentamente e arranca pelo por pelo de um braço cabeludo,
Dói mais quando se vai assim...
Ao
s
po
u
co
s..
sábado, 20 de julho de 2019
na linha que cortou ao meio aquele ano
Silêncio.
Sentei na cadeira de balanço embalei em meus braços o resto da minha vida.
Senti em minhas costas o macio conforto de um abismo - vida, morte, beleza e horror em profundidades e lonjuras até então desconhecidas.
Minha carne...Tão viva carne, viva. Crua.
Cria.
Viscera-l crisálida, pálida, sem-sangue/suga o peito, o leite. Via láctea.
Vi, nos olhos todos espalhados em ti, a mim, ao universo e a história de todos os tempos.
quinta-feira, 6 de junho de 2019
q ue ria
Comer
Uma coisa gostosa
Ouvir
Músicas legais
com
pessoas legais que não existem
Desenhar
com linhas bem finas
-Os sentimentos todos que me angustiam
Beijar
em chamas, quem ardendo me chamar
Queria morrer. Nascer...
Dançar...
No escuro,
no silêncio,
Cantar
Q ue ria
Escrever
des
con fi
gurada
mente] de forma bem
mediocre e estranha
ler
mentes
e mentiras
Decodificar entranhas
Queria querer,
mas acreditanto,
ao menos fantasiosa mente
] que teria o que quero
bem aqui
e bem
agora. Tudo isso,
em mim
tão forte quanto perto
me ofegando a res piraç~~ao
movimento em
es piral
respiro fundo
paro
e piro.
quinta-feira, 30 de maio de 2019
chuva
Há um buraco de minhoca crescendo em mim.
Outro dia Ceci molhou um dos lados de minha calça enquanto eu lhe banhava. Minha memória, com a rapidez da velocidade da luz, me levou para os tantos banhos de chuva que já tomei na vida. Me levou também a me perguntar pelo que me fez deixar de tomá-los.
Quando foi que parei de querer me molhar com a água do céu? Quando foi que fiquei completamente indisposta de receber as gotas caindo em meu corpo, enxarcando minhas roupas, abrindo meu sorriso em sol, em dó, em tom maior... ? Quando foi que me abandonei assim pelo caminho?
quinta-feira, 23 de maio de 2019
Macapá
Quando te vejo do alto, quando te vejo distante.
Por entre nuvens, tuas luzinhas, teu Amazonas caudaloso.
Sinto de uma só vez o peso de tua gente, tuas belezas e teu cotidiano doloroso.
Me viste crescer e sempre que parto penso no quanto também te quero bem e o quanto te quero grande.
sábado, 20 de abril de 2019
Linha imaginária.
Há uma linha,
Demasiadamente fina,
Que separa o "ser gigante" do "ser minuscula".
Ela me corta, bem ao centro, como o eixo de um planeta, o cerne de uma árvore, a linha do equador, o miolo de um livro.
Entendi, finalmente, que não adianta enxergar de outra forma esse tudo que eu sou... Ele é feito de "meio", interseção...
Duas metades:
Uma muito grande.
Uma muito pequena.
Ambas: eu.
E é fina, extremamente fina, essa separação.
Parece banal cambalear por esses lados.
E parece, cada vez mais, que é isso que é ser humano.
Agora entendo.
terça-feira, 16 de abril de 2019
Riso nascente
Quem te vê assim, aberta ao mundo por um sorriso, gargalhada leve, dentinhos cortando o vento, em um movimento profundo de alegria... Nao sabe, nem imagina, que vi quando nasceu teu sorriso! E não sabe que eu nao podia imaginar quão mais belo ele poderia ficar com o passar do tempo. Vi nascer um sorriso! Que rara beleza de se viver! Quanto mais vivo mais noto o quanto nao é tão difícil ver sorrisos morrerem. Quando o riso se põe, tal qual sol se indo num fim de tarde... Amarelado se esvai ... Mas ver um sorriso nascer, me estremeceu o sentir, é como se fizesse também nascer um sol dentro de mim.
domingo, 7 de abril de 2019
Manhã nova
De-li-ca-da-men-te
Tal qual gota de orvalho
Que ao mesmo tempo firme e trêmula
Em sua translúcidez cíclica
Na ponta da verde folha, viva e crescente
Sob a luz difusa, clara e serena do sol preguiçoso da manhã
Amanheço.
De um sono profundo... Vagaroso... Pesado... Escuro... Amanheço!
Me confundo com a manhã, me abro à luz viva do universo.
Abro os olhos, os olhos do mundo me abrem.
Eu, água... Volto a fluir entre muitas dimensões: Terra, ar, organismos vivos, escorro pelas ruelas, molho rostos, alago...
Evaporo, dissolvo, diluo, arrebento!
Chovo, como garoa, como tempestade!
Sou orvalho, oceano, poça.
Rio Amazonas, lago, pororoca!
Sigo... Nem sempre líquida e flúida, mas, de novo, em movimento.
segunda-feira, 23 de julho de 2018
O dia amanhece, mas ainda é noite.
Houve uma época em que guardávamos o tempo numa xícara, passou um pouco e xícara já não há. Assim como já não há mais nenhum tempo que se guarde. Estou em várias dimensões de mim agora. É confuso... Contraditório... Ridículo... Eufórico e triste ao mesmo tempo, como um vídeo de personagens conhecidos dançando e correndo ao som de "one way trigger" enquanto o sol se põe. Tenho dúvidas... Onde devo estar de fato? O que exatamento eu posso fazer? Onde está escrito tudo o que não posso me atrever a ser? Onde pego o mapa com as coordenadas de onde não estar? Todo humano precisa de uma mãe, eu diria. Elza disse que deus é mãe. Eu tenho cada vez mais medo (e raiva?) dessa palavra. Oscilo, como sempre, entre caimbras e espasmos. Nada continua. Hoje quero permanecer num lugar escondido de mim. Só queria poder misturar o som de água da música que tocava quando Cecília nasceu, com o que senti quando ela me encarou pela primeira vez, com o que sinto quando ela me abraça, com o que sinto quando ela fecha os olhos e dança, com o que sinto ao ver seu sorriso e seus passos, com o sinto ao ver o rio amazonas, e o que sentia ao tomar banho de chuva, ao dançar de olhos fechados, com o que sinto depois de tomar um copo de vinho, e o que sinto enquanto desenho, canto, filmo, vejo uma apresentação teatral ou filme que me arrebata...
Amanheceu mas ainda é noite, e as palavras povoam minha alma como quem narra uma história em um universo onde a minha voz importa. As vezes elas só me saem, sem forma, sem boniteza, só com letras e fome, gritando por liberdade. No fim das contas sou sempre eu, sozinha, distante, poente, falando sombras e luzes comigo mesma.
sábado, 7 de julho de 2018
Ano I
Curioso como um ano pode passar tão rápido e ser tão gigante ao mesmo tempo. Uma vez eu vi um ninho de beija-flor, feito num fio de energia, dentro de uma construção inacabada. Eu que sempre imaginei um ninho de beija-flor na infância, me emocionei e achei que nunca mais veria um igual. Eis que no sábado em que Ceci completou a primeira volta em torno do sol, vimos juntas uma mãe beija-flor, de uma espécie grande com peito branco, chegando em seu delicado ninho indo ao encontro de seu minusculo filhote. Quão pequena vida! Quão pequenas as nossas!? Nesse dia vimos também três anus brancos, enormes, abrindo suas lindas caudas e saltando entre os mururés no que parecia uma perseguição coletiva. Aprendi o nome regional do anu branco nesse dia, mas já esqueci.
Tem uma coisa de sol que a Cecília me apresenta que inaugura uma energia nova nesse meu universo tão lunar. É também uma coisa forte de silêncio e de presença integral, que ilumina e aprofunda cada segundo como um outro tipo de consciência da existência, mais atento e sensitivo. Me pergunto como uma mãozinha tão pequena, tão leve, tão macia, pode ser capaz de me tocar tão profundamente. Só sei que agora choro como quem é feita só de água. Preciso ouvir o que todas essas coisas me dizem antes que seja tudo diluído pela maré do devir.
quarta-feira, 20 de junho de 2018
Aqui d-entro.
Dentro... Onde entro e sento, fico, espero. Dentro... Onde sinto, vejo, amo, quero.
Dentro... Onde sonho, desejo, e bailo -gigante.
sexta-feira, 15 de junho de 2018
quinta-feira, 14 de junho de 2018
sussuro vazios
https://www.youtube.com/watch?v=nY3ghukPKtA
sábado, 2 de junho de 2018
Não sou grande.
quinta-feira, 22 de março de 2018
Ojos morochos
terça-feira, 13 de março de 2018
Nada com nada
domingo, 21 de janeiro de 2018
Desculpa, meu amor...
sexta-feira, 19 de janeiro de 2018
Foi um sonho (?)
quinta-feira, 18 de janeiro de 2018
É grande ao redor...
quarta-feira, 17 de janeiro de 2018
Dentro é um buraco sem fundo
segunda-feira, 1 de janeiro de 2018
sábado, 4 de novembro de 2017
domingo, 7 de maio de 2017
gravidade e vir-a-ser
Enquanto explodem no peito, vias lácteas
Abrem caminhos, criam sinapses, formam nebulosas.
Teu pequeno coração acelerado
Que é assim que a vida é.
Pois que, além de passarinho assustado
E és do norte!
Hão de desencadear
Choraremos!
Vai mesmo doer
quarta-feira, 19 de abril de 2017
haja palavra...
Da janela do taxi, sob o céu de uma manhã confusa, vi um casal de passarinhos marrons/rajados se equilibrando um sobre o outro num fio de energia. Faz tempo que não consigo traduzir o que sinto. Meus pensamentos e sentimentos vem a tona na consciência e nos poros todos de forma fragmentada, como numa edição frenética de um filme de terror, ação ou mesmo uma videoarte (sempre foi assim, mas às vezes fica mais forte, como nos últimos meses). Da janela do ônibus, sob o céu cinza de uma tarde quente e cansada, vejo alguém se embalar deitada em uma rede, em suas mãos sustentadas pelos braços esticados no ar, um neném, que naquele segundo de lá me fita e acompanha o deslizar de minha passagem pela rua. Aquele boto pequeno que outrora, através do meu tato, mostrava seu delicado dorso vez ou outra no rio amazonas de dentro de mim, aquele que eu sentia como se flutuasse sozinho em movimentos líquidos entre as noites de um céu estrelado feito de águas oceânicas, aquele que me jogava violentamente na mágica da existência só de sentir com as pontas de meus dedos que ele simplesmente estava ali... Este pequeno mamífero imbuído de sua solidão cetácea vem atravessando meses que escondem eternidades, supercordas distorcidas, quintessências, multiversos... Antes conectado muito mais aquele universo líquido mítico, espiritual habitado por seres os mais misteriosos, os quais, ocultos da paisagem visível, tinham a função de tornar aquele mundo um lugar encantado, agora muito mais presente neste aqui e neste agora, já consigo tocar sua humanidade, já me esmaga a bexiga e os pulmões seu peso. É uma Cecília! E que linda que me parece mesmo que eu nunca a tenha visto. Tenho sonhado com aglomerados de pessoas, muitos ambientes diferentes, acordo deles sempre com a sensação clara e viva de ter estado com e passado por muita gente, sem falas, nem toques, sem interação, almas passando entre si, e tem sido como se todo dia eu tivesse acabado de chegar de uma estação de metrô lotada. Acordada, o pensamento viaja entre informações aleatórias: Uma ruela de um lugar visitado em uma viagem. A sensação da água gelando a canela em alguma tarde leve de sol em qualquer lugar banhado por um rio. Um rosto. (Um não, muitos! Eles sempre vêm em minha mente aos montes, definitivamente rostos são como as vírgulas de meus pensamentos.) Um desenho que fiz em 2009. Um flash back de infância. Alguém bem próximo levou um tiro. Existem armas. O Brasil está afundando. Por que o Trump fez aquilo? O que mais estar por vir? Como vai ser o rosto dela? Um umbigo que vi numa foto. Como me toca essa "você que me continua" do Arnaldo. Bexiga parece sempre cheia. Eu já tive tantos amigos... As pessoas somem, eu sumi. (Ou nunca estive presente?) Que maravilha saber que aquele aluno vai bem na batalha que é a vida. Saudade das idas ao meio dia no trapiche e de pegar aquele vento que beijava só o meu rosto e o meu silêncio, ninguém mais entre o sol e o rio. Aquela cena que ficava passando na imaginação enquanto atravessei o Atlântico no ano passado. Os planos que eu tinha, os planos que tenho, as não certezas e as não expectativas... Pessoas... Conexões... Quem? Verde petróleo é lindo! Verde clorofila... A gente pega uma lata de euforia e mistura com três bisnagas vermelhas e duas marrons, eis o rosa Carla Antunes. "Não vou te deixar na mão, nem vou te deixar a pé, tenho um coração de mãe". Com quantos cômodos se faz um lar? Como pode tudo parecer tão claro assim? Alguém que eu não conhecia, mas cujos projetos eu acompanhava, morreu... Tão jovem, tão cheio de engajamento.... Me soou tão injusto, inacreditável em suma. As pessoas morrem! Têm muitas pessoas lutando pra viver nesse momento. Será que o Sandro vai ficar bem? E se aquele dia tivesse sido diferente? Haveria Cecília nesse meu presente? Será que um dia ela vai desejar que eu morra? Educação. Juventude. Violência. Macapá. Aquele primeiro episódio que mostra as baleias... Mais uma aluna grávida... Que dê tudo certo. "Homem de 19 anos é morto em troca de tiros com policiais" Na periferia não existe adolescência... Qual era o nome dele? Será que era meu aluno? De que matéria impregnante são feitas as ideias fixas? Preciso terminar meu roteiro. Não posso não terminar de ler aquele livro antes dela chegar. Será que vou acabar deixando estragar a porcelana fria que comprei? Vi uma lua cheia, esplendorosa, eram 6 da manhã, e ela toda enxerida encarava o sol no lado oposto do horizonte, tudo valeu a pena. Anteontem a cachorrinha deu dois saltos para dar duas lambidinhas na minha barriga! Ela nunca tinha nem percebido que eu tinha uma barriga e de repente resolve me pegar de surpresa e dar um oi pra esse alguenzinho, foi emocionante. Pitaya é uma fruta sem gosto que eu sempre comia por causa da cor linda, nunca havia pensado em perguntar o nome, aí um dia descobri como se chama e desde então aquele roxo vivo, de tom aberto, meio cítrico, nunca saiu da minha memória e é como se fosse muito doce aquela fatia-sorriso mesmo sendo quase inexistente o sabor. Ela mexe muito quando ouço música africana. Minha missão tem um nome que se soletra exatamente como se soletra a palavra e.d.u.c.a.ç.ã.o. Será que ano que vem consigo voltar a tentar um mestrado? Será que minha dor ciática vai deixar eu carregar essa menina? Será que vai ter um jeito de eu não me sentir tão exausta como descrevem as mães? Sinto saudades, muitas. Quando será que eu viajo de novo? Como será tudo daqui a um ano? Rostos... Temer. Sempre vejo alguém lhe acertando um tiro, acho que vem de uma série que assisti, ou então existe em mim a vontade que alguém morra, mesmo sabendo de tudo isso sobre viver, como posso querer isso? Cãibras... Falta de ar. Aquele momento em que fiquei sozinha nas pedras diante do azul da Bahia de Guanabara, meu sapato da Marisa era novo, aquele homem apareceu do nada, tive medo. Cara, aquele menino morreu mesmo... Ontem isso me perturbou de madrugada. A vida tem me agoniado todo dia, de novo essa sensação de existir emaranhando tudo, muita coisa ao mesmo tempo. Ontem palestrei pra vários professores, uma imagem que sempre via desde que comecei a trabalhar com educação... Domiciliar... "Uau! Vais ter coragem?" Sim, vamos tentar! Fugir é ilusão. Barulho me agonia muito. Olhei de novo as características de uma pessoa com autismo e dessa vez parece que tudo encaixou. Sou uma super recognizer, ao menos foi o que deu nos resultados de uns testes, partes de um estudo de que participei, da Universidade de Greenwich, pela internet. Lembro de quase 100% dos rostos que vi na vida, 90% se não me engano. Aquele texto do Ronaldo que fala da Mariana, meu deus, como amo! Foi impagável cantar "Um shopp pra distrair" com o Bradock, naquela calçada da Pe Júlio, precisamos terminar esse doc, nem pesquisei a música do cantor italiano que ele citou. Nunca falei tanto na minha vida quanto atualmente. La belle de jur. Mirtilos. Dei sorte... A sensação de rejeição foi soterrada por uma sensação colossal de aceitação, esse tanto de elogio vou ouvir até o dia de junho que Cecília vier, depois preciso tapar os ouvidos senão vira arrogância. (Ou sou eu que não sei lidar com a possibilidade de ser alguém bacana.) Vinho, ice, gengibirra... Sensações guardadas pra depois... Como se sabe que chegaram esses depois? Confiança é uma lenda? Será? Obrigada! Me desculpe. Eu te amo. Talvez hoje eu consiga fazer um desenho. Minha cabeça dói. "Quero tudo que meu olho cego de cachorro raivoso fareja", essa frase lateja na minha mente de vez em quando. Latejar... Notei agora que lateja-se tanto de dor quanto de prazer. Atrasei pro pilates. Alguém bate a porta, não abro. Como é irritante o latido das cachorrinhas aqui de casa. "A gente foi feito pra voar, no vento que bate pra gente se secar." Aumentei o volume. Fiz um spotify, mas não sei usar. Vou continuar com minha lista infinita no youtube. Que cansaço. Amo a rua de casa quando está deserta e mais ainda quando choveu e o asfalto fica com um brilho amarelado por causa do reflexo da luz amarela dos postes, e se for madrugada, o vento, o silêncio... Aaaah! "Virá! Impávido que nem Mohamed Ali". Tudo isso enquanto desacelero cada vez mais meus passos, enquanto meus peitos se rasgam (literalmente) em vias lácteas, enquanto o passado vai sumindo e o presente se arrasta... Eu espero... E vou me embolando nesses emaranhados de informações. As vezes é tanto tudo que me imobilizo. Enfim transbordei.
terça-feira, 7 de março de 2017
sobre uma mente programada para ver fantasmas
sábado, 18 de fevereiro de 2017
Aquelas tardes fevereiras
Ontem finalmente pude ser fantasma de novo e vagar pelas ruas a esmo, calada, sem encontrar ninguém que conheço, só vendo e sendo a/na cidade. Eu e a sombrinha, e o asfalto, e as pessoas sem rostos; eu e o rio, e o trapiche, e a maré enchendo; eu e o chuvisco, os bancos úmidos de concreto e as tardes fevereiras. Nós todos e estes sentimentos arvorescos que se afincam entre os becos apertados desses dias... Aquela cor de tinta que não gostei, aqueles carnavais que não vivi, aquelas músicas, aquelas vidas secretas das lágrimas notívagas, aquele desejo de criar coexistindo com aquela inércia... Coisas de quem se amofina em si nestes dias molhados e regados de sentimentos alegretes de ansiosos foliões. Jeito desencontrado de qualquer coisa, esse meu.