terça-feira, 17 de julho de 2012

Bege, dores, ônibus.

Dia bege. Ônibus lotado.
Do fone sai a voz rouca e nordestina de Belchior. Na tela fina pendurada atrás da cadeira do motorista, completamente mudas, muitas mulheres semi-nuas cantam, rebolam, são carregadas, tocadas e enfregam-se uma nas outras. No banco em minha frente uma criança me encara. Olho da janela pra rua e de repente alguém que fito por segundos vira e olha exatamente na direção de meus olhos, como se sentisse meu olhar a cutucar suas costas. Vejo uma moto sendo lavada numa calçada. Um laranjado muito forte em algum objeto qualquer me chama a atenção em outra parte da rua.

Em minha mente pensamentos muito rápidos passam sob a forma de palavras soltas: 
"Letargia", "loucura", "fumaça", "taquicardia", "parada", "escolha"...

Em alguma cama por aí alguém sente dores muito fortes. Dentro de uma casa perto dali alguém acha que vai morrer e que não suportará a corrosão interna sentida neste instante. Um pouco mais distante nascem algumas pessoas. Menos longe, alguém que deveria trabalhar não consegue parar de pensar em algo que muito lhe preocupa. Passo pela ladeira e no ritmo das rodas do ônibus "deslizo" por debaixo das sombras frondosas daquelas àrvores gigantes.
Em meu rosto, vento. Em meus olhos, sede. Em meu coração, flores e medo.

Ouço sons de vida brotando e tão fortemente de morte também. Há céu, asfalto, carros, gente, grades, cores, barulho, lágrimas. Há dores, sorrisos, estrelas, crimes, filmes, café, desenhos, chuvas, taxis, vinhos, mágicos, ventiladores quebrados, aviões, casamentos.

Há tantas coisas.
Onde a ordem? Nada tem a ver com nada.  Não tem nada a ver estarmos aqui. Nada tem a ver.
A vida tem me saído tão desconexa... Grande, bela e doida desconexão